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Atualmente desenvolvemos projeto de pesquisa, em nível de doutorado, que tem como meta compreender qual o lugar dos mestiços na formação dos grupos sociais que viveram na Freguesia do Seridó, sertão do Rio Grande do Norte (1748-1835). Consideramos como mestiço, partindo da problematização de Serge Gruzinski, os indivíduos que participaram, na América portuguesa, da experiência do contato e misturas entre pessoas de diferentes partes do mundo, em decorrência da ocidentalização promovida pela empresa ultramarina ibérica, que toma corpo a partir do século XVI – a mestiçagem podendo ser, portanto, biológica ou cultural. Um dos corpus documentais utilizados na pesquisa é constituído das fontes judiciais da Comarca de Caicó, que incluem papéis avulsos, notas de cartório, testamentos, justificações de dívida e inventários post-mortem num recorte diacrônico que começa em 1737. Com este trabalho, propomos uma primeira aproximação com essas fontes, no sentido de refletir como essas diferentes tipologias documentais podem nos ajudar a compreender a realidade da população mestiça, considerando, previamente, que a historiografia “clássica” e regional potiguar, de certa forma, obliterou o fenômeno das mestiçagens (biológicas ou culturais), face à proeminência imputada às elites agropecuaristas e tidas como de origem branca e portuguesa. Tomamos como foco de análise a trajetória do mestiço Caetano Soares Pereira de Santiago, que veio de Santo Antonio do Recife para o Seridó e, na documentação, foi gradativamente sendo chamado de crioulo forro, preto, preto forro e pardo, à medida que demarcava seu espaço dentro da sociedade colonial. Para responder à problemática levantada, partimos da idéia de que os dados e informações que nos interessam não aparecem chapados nas fontes, encontrando-se imiscuídos nos diferentes documentos. É necessário, assim, que os indícios recolhidos possam ser esquadrinhados, comparados com outras fontes e cruzados com outras realidades, bem como, observados com minúcia e rigor, como indica Carlo Ginzburg ao discutir a validade do método indiciário. Da mesma forma, acreditamos que a elucidação das questões passa por uma crítica documental a esses diferentes tipos de fontes, ainda mais quando referimo-nos a populações marginalizadas historicamente, como os mestiços. Além do mais, temos a consciência de que essas fontes se constituem enquanto discursos coloniais, carregados de conceitos e de filtros decorrentes do lugar social onde os seus produtores estavam localizados. Apresentam, portanto, uma versão fragmentária do passado e restrita à visão de mundo daqueles que os redigiram. |
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